quinta-feira, setembro 07, 2017

O Brasil precisa de um grito da interdependência





por Leandro Narloch(*), 



Eis uma contradição interessante: o conforto e o tempo livre que milhares de brasileiros desfrutarão neste feriado da Independência são possíveis por causa da interdependência. 

Só porque bilhões de pessoas de todo o mundo cooperam entre si, se especializando em alguma atividade e trocando o resultado, é que podemos nos dar ao luxo de passar alguns dias sem produzir, sem trabalhar e gastando o salário com churros e caipirinha na praia. 

Não quero questionar a importância do Sete de Setembro —a data marca o dia em que brasileiros conquistaram o direito de legislar sobre si próprios. Mas se independência política é uma conquista, a independência econômica é uma maldição, o caminho certeiro para a miséria. 

O carro que muitos brasileiros usarão para viajar neste feriado é uma deslumbrante combinação de ideias, materiais e trabalho de pessoas dos mais diversos países e épocas. Usa resinas plásticas inventadas no século 20 e fabricadas com petróleo sabe-se lá de onde, minério de ferro brasileiro ou australiano, rodas inventadas há 6.000 anos, um motor de combustão que em si próprio é uma mistura de invenções dos últimos três séculos. 

O carro só é possível porque a especialização e o comércio criam o “sexo entre ideias”, como diz o escritor Matt Ridley. 

Pois imagine se você fosse obrigado a produzir um carro de forma independente —ou, muito menos que um carro, um simples retrovisor. Levaria meses tentando entender o processo da produção de vidros e espelhos. Precisaria estudar a extrção de petróleo, a transformação do óleo em resinas, montar fornos e máquinas de injeção plástica. 

Se algum dia conseguisse dominar todo o conhecimento necessário, gastaria muito mais que o valor de um carro completo para produzir um de seus componentes. 

É por isso que países e indivíduos que insistem na autossuficiência e na independência econômica tem a pobreza como destino. Gastam recursos demais para produzir coisas que poderiam obter com mais facilidade pelo intercâmbio. Ficam de fora da suruba global de ideias e inovações. 

A interdependência ainda é uma força em prol da paz. Brasileiros terão menos vontade de abrir as comportas e inundar a Argentina se dependerem dos vizinhos para conseguir trigo, carros ou suco de pêssego. Chineses têm mais incentivos para se preocupar com a paz e a prosperidade do Brasil se tiverem propriedades por aqui ou se dependerem de nós para obter carne, minério ou aviões. O comércio entre países faz os pequenos e repetidos lucros superarem o butim conquistado por guerras e pilhagens. 

Tenha um bom feriado neste Sete de Setembro-e agradeça à interdependência econômica por poder comemorar nossa independência política. 

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(*)Leandro Narloch é mestre em filosofia, autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil entre outros e colunista da Folha de São Paulo 

Fonte: Jornalonoroeste.com.br

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